O Movimento fez, há alguns meses, um pedido de audiência ao Ministério da Cultura. A resposta chegou há alguns dias. E aqui fica a reposta que nós próprios enviámos ao Ministério:
0.
Recebeu este Movimento de Cidadãos uma mensagem por eMail, não assinada, e datada de 21 de Abril de 2010, com a seguinte procedência: Gab Sec Est Cultura <gsec@mc.gov.pt> .
1.
Sobre os parâmetros estabelecidos pelo Ministério da Cultura como base para a classificação que se propõe efectuar para o Mercado do Bom Sucesso – citações site IGESPAR, 2010 – Ficha técnica
“ Categoria / Tipologia
Mercado
(…)
Situação actual
Em Vias de Classificação
(…)
Categoria da Classificação
Em Vias de Classificação (com despacho de abertura)
(…)
Descrições
Nota histórico – Artística
(…) No interior, e obedecendo ás particularidades programáticas do edifício, a concepção espacial do edifício organiza-se por zonamentos, com bancas particularizadas por produtos de diferentes naturezas.
(…)
Esta obra atinge um expressionismo notável ao resultar da conjugação de valores como a curva horizontal da planta e o dinamismo operado no perfil da cobertura, elementos que resultam valorizados na qualidade da luminosidade obtida no espaço criado.(…)”
NOTA DO MOVIMENTO:
Enquanto movimento que se propõe salvaguardar o Mercado do Bom Sucesso – quer enquanto tipologia mercado, quer enquanto edifício modernista – acusamos a recepção em 21 de Abril de 2010 de um e-mail relativo a este assunto da parte do Ministério da Cultura claramente contrário a estes propósitos – os propósitos que o próprio Ministério se propõe a defender no site do IGESPAR com a sua proposta de classificação.
É clara nesta missiva a mudança de opinião por parte do Ministério relativa ao programa Mercado para este edifício:
Citação do e-mail 21 de Abril de 2001 – Ministério da Cultura, Ponto 2:
“ O Estudo apresentado a concurso prevê a preservação da Espacialidade interior, pese embora, seja introduzido nas extremidades dois blocos, um destinado a Hotel e outro a escritórios. Ao centro mantém-se um espaço destinado a mercado de comércio, eventualmente mais ajustado a novos padrões de hábitos de consumo. Toda a imagem exterior do imóvel é mantida.”
Em nada se verifica a preservação da função Mercado, sobretudo tal como a função actualmente se apresenta – apenas e exclusivamente Mercado.
Diminuiria o número de comerciantes de aproximadamente 144 para cerca de 40, conforme a proposta conhecida de alteração projectada pela empresa Eusébios.
Consideramos que a aprovação deste Projecto por parte do Ministério da Cultura contradiz igualmente os seus próprios parâmetros de classificação enquanto edifício Modernista, claramente expressos no site do IGESPAR:
a) O “expressionismo notável ao resultar da conjugação de valores como a curva horizontal da planta e o dinamismo operado no perfil da cobertura, elementos que resultam valorizados na qualidade da luminosidade obtida no espaço criado”, conforme o site do IGESPAR,
são profundamente afectados pela introdução dos tais blocos interiores previstos pelo projecto da empresa Eusébios.
“pese embora, seja introduzido nas extremidades dois blocos, um destinado a Hotel e outro a escritórios”, citação e-mail do Ministério, o que, ao contrário do afirmado no mesmo e-mail, não prevê de modo algum “a preservação da Espacialidade interior”, portanto.
b)” Toda a imagem exterior do imóvel é mantida.”- citação e-mail do Ministério.
Concordamos com este ponto, e reforçamos que neste edifício concreto o objecto de preservação que o Movimento pretende valorizar em consonância com o proclamado no site do IGESPAR é a sua totalidade, não apenas a fachada, assim como a sua funcionalidade.
O interior – precisamente o alvo da intervenção do Concurso elaborado pela Câmara do Porto, ganho pela empresa Eusébios e participado pelo Ministério da Cultura enquanto júri.
Citação do e-mail 21 de Abril de 2001 – Ministério da Cultura, Ponto 1:
“1.O Ministério da Cultura, através da Direcção regional de Cultura do Norte (DRCN) integrou, a convite da Câmara Municipal do porto, o Júri do Concurso Público Internacional para a Constituição do Direito de Superficie sobre o Mercado do Bom Sucesso, tendo analisado as duas propostas apresentadas nesse contexto, com base nos estudos prévios apresentados.
(…)”
Em nada se verifica a preservação da espacialidade interior expressa pelas intenções iniciais do IGESPAR, quando inclusivamente o próprio objecto do Concurso foi a alteração física do espaço.
A própria participação do Ministério no júri deste Concurso contradiz a classificação patrimonial a que se propôs. Enquanto movimento, temos a certeza que o Ministério da Cultura tem o poder e todos os instrumentos legais à sua disposição para anular o Concurso efectuado, assumindo a seu encargo a Protecção do Património a que se propôs.
Este é efectivamente o seu primeiro dever para com os cidadãos, independentemente de qualquer participação enquanto júri do Concurso de Concessão do direito de Superfície:
Citação e-mail do Ministério:
“4. Quanto ao procedimento de classificação do imóvel, o Mercado do Bom Sucesso obteve em 28/10/2009 um parecer favorável à classificação como Monumento de Interesse Público por parte do Conselho Consultivo do Instituto de Gestão do património Arquitectónico e Arqueológico, I.P. (IGESPAR, I.P.).”
2.
Citação e-mail do Ministério:
“Ao centro mantém-se um espaço destinado a mercado de comércio, eventualmente mais ajustado a novos padrões e hábitos de consumo.”
Fazemos notar que a empresa Eusébios anunciou que pretende construir um misto de centro comercial/escritórios/hotel/lojas gourmet. Toda a zona envolvente deste edifício, a Boavista, está já saturada de construções deste tipo, havendo imensas lojas abandonadas em centros comerciais nessa mesma rua ou ruas adjacentes. Não compreendemos o que poderá tal modelo ter de «mais ajustado» do que o actual mercado municipal. Tivesse este equipamento público condições para operar com toda a dignidade e a higiene requeridas na actualidade, fossem novos comerciantes autorizados a estabelecer-se aí e o mercado não apresentaria a situação de abandono que poderá estar por trás do equívoco de o considerar «pouco ajustado». O contrário tem sido feito sistematicamente pela Câmara Municipal do Porto a quem compete a manutenção do edifício, mas que tem, pelo contrário, proibido toda a intervenção de manutenção por parte dos próprios comerciantes e não tem feito nenhuma por iniciativa sua. Isto é particularmente patente no estado de degradação em que recentemente instalou as bancas do peixe depois de mudar as comerciantes para outra zona do edifício, colocando bancas de inox por cima dos escombros das anteriores, de tijolo e azulejo.
3.
Sobre os efeitos da abertura de um processo de Classificação
-citação Lei nº 107 / 2001 – Bases da Política e do regime de protecção e valorização do património cultural
“Efeitos da abertura do procedimento
Artigo 42º
Efeitos da abertura do procedimento
1 – A notificação do acto que determina a abertura do procedimento de classificação de bens imóveis nos termos do artigo 15º da presente lei opera, além de outros efeitos previstos nesta lei, a suspensão dos procedimentos de concessão de licença ou autorização de operações de loteamento, obras de urbanização, edificação, demolição, movimentos de terras ou actos administrativos equivalentes, bem como a suspensão dos efeitos das licenças ou autorizações já concedidas, pelo prazo e condições a fixar na lei.
(…)”
Sobre a qualidade da salvaguarda prevista para um edifício ainda em “Vias de Classificação” – em tudo semelhante à de um edifício já Classificado
-citação Decreto-Lei nº 309 / 2009 – Classificação de bens Culturais Imóveis
No preâmbulo do Decreto-lei:
“Na verdade, a lei nº 107 / 2001 de 8 de Setembro, determina cautelarmente que o início do procedimento de classificação tem como consequência a suspensão dos procedimentos e licenças ou autorizações urbanísticas em relação ao imóvel como condição da respectiva salvaguarda. Entende-se que a suspensão se deve manter até à decisão do procedimento de classificação.(…)”
(…)
Artigo 15º
Suspensão de licenças ou autorizações
(…)
A Suspensão dos procedimentos de concessão de licença ou autorização (…) mantém-se até à decisão final do procedimento de classificação, salvo se outro prazo for estabelecido na decisão de abertura do respectivo processo de classificação.
(…)”
4.
Sobre o dever de actuação do Estado perante uma situação de atentado patrimonial em execução.
-citação Lei nº 107 / 2001
“Artigo 33º
Medidas provisórias
1 – Logo que a administração Pública tenha conhecimento de que algum bem classificado, corra risco de destruição, perda, extravio ou deterioração, deverá o órgão competente da administração central, regional ou municipal determinar as medidas provisórias ou as medidas técnicas de salvaguarda indispensáveis e adequadas, podendo em caso de impossibilidade própria, qualquer destes órgãos solicitar a intervenção de outro.
(…)”
NOTA DO MOVIMENTO:
Assim, e enquanto Movimento que pugna pela salvaguarda do património Mercado do Bom Sucesso, chamamos a atenção às autoridades para o seu dever de inverter o atentado em curso, para o qual a Lei nº 107 / 2001 e o Decreto-Lei nº 309 / 2009, remetem e a que obrigam.
Com os nossos cumprimentos,